Elogio do Anacronismo – O Ocidente, a história grega e o pensamento feminista

Ementa:
O curso visa discutir perspectivas teórico-metodológicas para a abordagem de alguns dos procedimentos pelos quais a formulação de modelos femininos (corpos, espaços, tempos, subjetividades) entre os séculos XIX e XX, principalmente no âmbito das propostas civilizacionais de Ocidente, operou por releituras de papéis de gênero na Antiguidade grega. Trata-se, então, de refletir sobre os usos da Antiguidade Clássica em discursos vinculados particularmente à formação da mulher, permitindo-se o exercício de um “anacronismo controlado” para compreender esse aspecto especular da remissão aos gregos: a familiaridade cultural, a linearidade temporal e a homogeneidade física com que o exemplo das “mulheres de Atenas” é retomado precisa ser aprofundada como prática discursiva, fruto de uma leitura retrospectiva em que o fenômeno da pólis e a divisão das esferas pública e privada em masculino / feminino reverberam, por exemplo, a valorização do Estado-nação por uma elite política e intelectual urbana. Sugiro, assim, que o espelhamento nos “gregos antigos” é um dos elementos que contribui simultaneamente para criar e justificar não apenas as “mulheres de Atenas” mas ainda “A Mulher” natural na dimensão minoritária das trocas simbólicas feitas principalmente através das leituras (livros, imprensa periódica) e da formação escolar. O pensamento feminista, especificamente em iniciativas como as de Marilyn Strathern e Donna Haraway, nos permite debater essa releitura dos gregos antigos no que ela implica o “despensamento” de parâmetros teórico-metodológicos, dentre os quais enfatizarei “tempo”, “subjetividade”, “natureza”.

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